sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Pessoa de bem precisa se armar para se defender da bandidagem?

Com o título “Usar arma lhe daria mais segurança?”, eis artigo do jornalista e sociólogo Demétrio Andrade. Ele aborda tema dos mais polêmicos e lança uma reflexão para os leitores do Blog. Confira:
Moro num país violento e numa cidade insegura. O Mapa da Violência 2015 mostra que 42.416 pessoas morreram em 2012 vítimas de armas de fogo no Brasil: 116 mortos por dia. Só estes dados já justificariam meu temor em relação à discussão irresponsável travada no Congresso Nacional – que tem hoje, sem dúvida, uma das piores legislaturas de sua história –, que quer alterar o Estatuto do Desarmamento.
A proposta da chamada “Bancada da Bala”, intitulada Estatuto de Controle de Armas de Fogo, reduz de 25 para 21 anos a idade mínima para o porte de armas e assegura a todos os cidadãos, desde que cumpram pré-requisitos legais, o direito de portar armas de fogo. Acaba também a proibição de que pessoas que respondam a inquérito policial ou a processo criminal adquiram armas.
É importante ressaltar que mesmo com as atuais restrições legais, é fácil adquirir armas. Segundo o “Mapa do Tráfico Ilícito de Armas no Brasil e o Ranking dos Estados no Controle de Armas Brasil”, o país tem hoje 16 milhões de armas de fogo, sendo que 80% estão nas mãos de civis.
O argumento mais fajuto dos que querem liberar este comércio é de que “a pessoa de bem precisa se armar para se defender da bandidagem”. Ora, além de desresponsabilizar o Estado, tal situação colocaria o cidadão na linha de fogo. E não somente contra criminosos. Pesquisa do Conselho Nacional do Ministério Público, de 2012, elaborada a partir de inquéritos policiais referentes a homicídios acontecidos em 2011 e 2012, em 16 estados, apontou que as maiores causas de homicídios decorreram de motivos fúteis, como “brigas, ciúmes, conflitos entre vizinhos, desavenças, discussões, violências domésticas, desentendimentos no trânsito”.
Como se vê, não é qualquer pessoa que tem habilidade de portar uma arma de fogo. E o despreparo para lidar com situações-limite só aumentaria a insegurança. O parâmetro mais contundente e que confirma esta realidade vem de quem, teoricamente, é profissional do ramo. A edição 2014 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostra que, em apenas cinco anos, as polícias brasileiras – civil e militar – mataram tanto quanto a americana em três décadas. Foram 11.197 mortes causadas por policiais entre 2009 e 2013. Aliás, os policiais são vítimas potenciais: no período de cinco anos, 1.770 foram mortos – 490 apenas no ano passado. Ora, que segurança poderia lhe trazer uma arma se nem policiais estão a salvo com elas?
Nos EUA, onde quase 90% da população possuem armas de fogo, cerca de 400 pessoas são mortas pela polícia a cada ano. Em compensação, no Reino Unido, só dois policiais foram mortos em serviço nos últimos sete anos e apenas três disparos foram efetuados entre maio de 2012 e abril 2013. A polícia britânica usa artigos de menor potencial ofensivo. Somente oficiais com treinamento específico usam armas de fogo, mas eles representam apenas 5% do total da tropa.
Não sou especialista na área e nem tenho soluções para o problema. Mas peço ao leitor que se informe antes de sair por aí replicando sandices elaboradas por pessoas de má-fé. Partir do princípio de que é preciso, se necessário, matar um semelhante para ter segurança, é estigmatizar a paz como uma derrota. E somente uma cultura de paz pode combater a violência.
*Demétrio Andrade,
Jornalista e sociólogo.

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