sexta-feira, 7 de outubro de 2011

DISCURSO DA PROFESSORA AMANDA GURGEL (RN)

A situação de humilhação porque passam os professores estaduais cearenses se parece muito com os professores lá do Rio Grande do Norte. Leiam um discurso proferido por uma professora de coragem lá do estado potiguar e digam se as situações não se parecem.

Discurso da Professora Amanda Gurgel na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte
Bom dia a todas e todos, durante cada fala aqui eu pensava como organizar a minha fala. São tantas questões aqui colocadas e angustias do dia a dia de quem está em sala de aula e quem está em escola, eu queria pelo menos sintetizar minimamente essas angustias.

Como as pessoas apresentam muitos números e sempre colocam que os números são irrefutáveis eu gostaria também de apresentar um número pra iniciar a minha fala. Que é um número composto por 3 algarismos apenas, bem diferente dos números que são apresentados aqui com tantos algarismos (se referindo aos parlamentares da assembléia legislativa) que é o número do meu salário. Um nove, um três e um zero que é meu salário base, R$930,00 e ai eu queria fazer uma pergunta a todas e todos que estão aqui sem nível superior com especialização: se vocês conseguiriam, mas só respondam se não ficarem constrangidos obviamente, se vocês conseguiriam sobreviver ou manter o padrão de vidas que vocês mantém com este salário (R$930,00)?… Não conseguiriam. Certamente esse salário não é suficiente pra pagar nem a indumentária que os senhores e as senhoras utilizam pra freqüentar está casa aqui, não é?

Assim minha fala não poderia partir de um ponto diferente desse, porque só quem está em sala de aula, só quem está pegando três ônibus por dia pra chegar ao seu local de trabalho, ônibus precário inclusive, é que pode falar com propriedade sobre isso. Fora isso qualquer colocação que seja feita aqui, qualquer consideração que seja feita aqui é apenas para mascarar uma verdade, que é uma verdade visível a todo mundo, que é o fato de que em nenhum governo, em nenhum governo que nós tivemos no nosso Estado (Rio Grande do Norte), na nossa cidade, no nosso país a educação foi uma prioridade. Em nenhum momento. Então me preocupa muitíssimo a fala da maioria aqui, inclusive da secretária Betânia Ramalho, com todo respeito, que é: “não vamos falar da situação precária porque isso todo mundo já sabe”.

Como assim não vamos falar da situação precária. Gente! Nós estamos banalizando isso dai, estamos aceitando a condição precária da educação como uma fatalidade. Estão me colocando dentro da sala de aula com um giz e um quadro pra salvar o Brasil? É isso? Salas de aulas super lotadas com os alunos entrando a cada momento com uma carteira na cabeça, porque não tem carteira nas salas. Sou eu a redentora do país? Não posso, não tenho condições. Muito menos com o salário que eu recebo!

A secretária disse ainda: “que nós não podemos ser imediatistas, ver apenas a condição imediata, precisamos pensar a longo prazo”, mas minha necessidade de alimentação é imediata, a minha necessidade de transporte é imediata, a necessidade de Jéssica de ter uma educação de qualidade é imediata.

Eu gostaria de pedir aos senhores, inclusive, que se libertem dessa concepção errônea, extremamente equivocada, isso eu digo com propriedade, sou eu que estou lá, inclusive além, propriedade maior até que os grandes estudiosos. Parem de associar qualidade de ensino da educação com o professor dentro da sala de aula, parem de associar isso daí. Porque não tem como você ter qualidade em educação com professores três horários dentro de sala de aula. Porque é assim que os professores multiplicam os 930. 930 de manhã, 930 à tarde e 930 à noite pra poder sobreviver. Não é pra andar com bolsa de marca ou usar perfume Francês é pra ter condição de pagar a alimentação dos seus filhos, é pra poder pagar a prestação de um carro, que muitas vezes eles compram pra poder se locomover mais rapidamente de uma escola e outra. E eles precisam escolher o dia em que vão andar de carro porque não tem condição de comprar o combustível.
A nossa realidade, o cenário da educação no Rio Grande do Norte hoje é esse. Não me sinto constrangida em apresentar o meu contra cheque, nem a aluno, nem a professor e nem a nenhum dos senhores aqui. Porque eu penso que o constrangimento deve vir de vocês. Sinto muito, eu lamento, mas deveriam todos estar constrangidos. Entra governo e sai governo, peço desculpa mais uma vez a você Betânia, mas não tem novidade na sua fala. Sempre o que se solicita da gente é paciência, é tolerância e eu tenho colegas que estão aguardando pacientemente há 15 anos, há 20 anos por uma promoção horizontal. Professores que morrem e não recebem uma promoção.

Então eu quero pedir a secretária, em primeiro lugar, paciência também porque nós não agüentamos mais esse discurso, não agüentamos! O que queremos é objetividade, como que é? queremos sair desse impasse? Queremos, mas como? Sem nenhuma proposta, de mãos abanando. Voltar mais uma vez desmoralizado pra sala de aula pro aluno dizer: “professora nós ficamos aqui sem ter aula e só isso”. Vocês receberam vinte reais, trinta reais e dão risada.

Pedimos ainda secretária, respeito pra que a senhora não vá mais a mídia dizer assim: “pedimos flexibilidade” como se nós fossemos os responsáveis pelo caos, que na verdade só se apresenta pra sociedade quando estamos em greve, mas que está lá, todos os dias dentro da sala de aula, dentro da escola e em todos os lugares. Respeito, não se refira a nossa categoria dessa forma, não se refira, nem se refira apenas como se fosse à direção do SINDE que está querendo fazer essa greve, não é não, são 90% da categoria.

Noventa por cento da categoria no Estado inteiro, nos interiores e aqui na capital. Pedimos aos deputados, apoio. Estejam mais presentes, participem ali, vão a nossa assembléia, procurem ouvir os trabalhadores, procurem saber a realidade. Pedir à promotoria que esteja com a fiscalização efetiva, ao ministério público, mas que não seja pra dizer: “professor não pode comer desse cuscuz não porque é um cuscuz alegado”, o cuscuz que a gente come, o cuscuz da merenda. Porque a promotoria está ali pra dizer que a merenda é do aluno não é do professor, é assim que funciona.

Diga-se de passagem, nós não temos recurso para nos alimentar diariamente fora de casa, não temos pra isso. São muitas questões mais complexas, questões muito complexas que poderiam ser colocadas aqui, mas infelizmente o tempo é curto e eu gostaria de solicitar isso em nome dos meus colegas que comem o cuscuz alegado, em nome dos meus colegas que pegam três ônibus pra chegarem ao seu local de trabalho, em nome de Jéssica que está sem assistir aula nesse momento, mas que fica sem assistir aula por muitos outros motivos: por falta de professor, por falta de merenda… É isso que eu quero dizer…
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Pois é, senhores depois vem nossos governantes propagarem aos quatro cantos do mundo que o professor é valorizado.
Eu num caio mais nessa, e vc ??

Postado por EdsoNorberto

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